O nascimento da filosofia por Luisa Buarque

Na última aula da Universidade das Quebradas no Polo da Rocinha, no dia 21 de março, não faltaram reflexões e cabeças nas nuvens. Quem impulsionou as “viagens” foi a professora Luisa Buarque, que fez uma introdução à Filosofia Antiga. A partir das opiniões dos quebradeiros sobre o que vem à cabeça quando se ouve a palavra filosofia, a convidada voltou à Grécia Antiga para explicar o que é e como surgiu a arte do “amor ao saber”.

Entre as visões de mundo, os pensamentos abstratos e o estudo de questões sem resposta, como os alunos sugeriram, o filósofo tem a função de pensar sobre o modo de vida, o comportamento e os padrões que sustentam as crenças dos seres humanos. Segundo Luisa, a filosofia acredita que o funcionamento do mundo possui uma razão e pode sempre ser mudado.

Na Grécia do século VI a.C, a filosofia surgiu como um pensamento diferenciado sobre a vida. Até então, apenas os mitos poéticos transmitidos oralmente eram capazes de explicar questões como; as mudanças do tempo, a organização da sociedade, a natureza, os medos. Para contornar a dificuldade de memorização dos contos míticos – numa época em que a escrita ainda não existia – a musicalidade era a solução para manter vivas as histórias tradicionais entre gerações.

De acordo com a professora convidada, esse cenário de nascimento explica a ligação entre a poesia musicada e a filosofia. Os gregos idolatravam a deusa Mnemosine, que personalizava a memória, capaz de imortalizar grandes atos, personagens e casos. A Poesia está ligada a manutenção da tradição e a memória que é pilar de sustentação de uma civilização.

O pensamento filosófico apareceu pela primeira vez com Tales de Mileto, no século VI a.C.. Primeiro homem capaz de fazer suas próprias análises sobre o mundo, ultrapassando as explicações míticas. Entre outros feitos Tales concluiu buscando uma síntese: “tudo é água”. Além de apontar corretamente a água como ponto em comum na origem e composição de todas as formas de vida, Tales deu início à ideia de superação dos conceitos tradicionais.

Apesar de se aproximar da religião e da ciência em alguns aspectos, a filosofia se diferencia na maneira como busca explicações para as questões abstratas da existência humana. Ainda que não utilize dados estatísticos, o filósofo procura argumentos coerentes para desenvolver e justificar suas ideias. A filosofia é baseada na especulação, na imaginação fundamentada, enquanto a ciência precisa de números, amostras e testes.

Em relação ao pensamento religioso, a “busca pela sabedoria” segue em direção oposta quando o assunto é reflexão. Ao contrário do viés doutrinário das igrejas, a filosofia impulsiona o pensamento crítico sobre as certezas e as dúvidas pertencentes a uma sociedade, para que o ser humano sempre renove suas afirmações e, assim, aprimore sua maneira de viver e o conhecimento sobre si mesmo.

Para fechar a aula, Luisa Buarque leu com os quebradeiros um trecho do texto O Banquete, de Platão, em que o mito do nascimento do Amor (Eros) é ligado à caracterização do que é ser filósofo.

Segundo o texto, a sabedoria é o centro da filosofia e, a partir dele, existem três categorias de seres ligados ao conhecimento. Os que chegam a esse centro são chamados de sábios e não buscam o conhecimento porque já o possuem. Já os que se distanciam do saber são os ignorantes, que não desejam possuir conhecimento por acreditarem que já o têm. Por fim, aqueles que sabem da existência da sabedoria, mas crêem nunca a possuírem por inteiro e por isso estão sempre aprendendo mais, são chamados de filósofos.

Seguindo a lógica apresentada por Platão, enquanto seres humanos, brasileiros, cidadãos e quebradeiros, somos também filósofos. Afinal, estamos todos apaixonados pelo inatingível saber.

todos
Depois da aula, o território da palavra.

Por Júlia de Marins – Bolsista PIBEX/ECO e Rute Casoy assistente pedagógica UQ – 24 de março de 2013