Política pública e cultura da periferia, por Sheila Suzane

O Instituto Brasileiro de Políticas Públicas (IBRAPP) define política pública:

“Políticas Públicas são diretrizes, princípios norteadores de ação do poder público; regras e procedimentos para as relações entre poder público e sociedade, mediações entre atores da sociedade e do Estado. São, nesse caso, políticas explicitadas, sistematizadas ou formuladas em documentos (leis, programas, linhas de financiamentos) que orientam ações que normalmente envolvem aplicações de recursos públicos.
Fonte: http://www.ibrapp.com/index.php?option=com_content&view=article&id=64

No Brasil não há uma boa tradição no fomento de políticas públicas voltadas para a cultura. Em geral fazem da política de governo (que tem o tempo de vida de um mandato) uma constante, e “esquecem” que não haverá continuidade dessas práticas se elas não estiverem amparadas por uma legislação. Quando uma ação se torna uma política pública, o governo vindouro terá a obrigação jurídica de dar continuidade àquelas ações.

Falar de cultura é falar de um universo vasto, pois cultura não se restringe a uma única manifestação, cultura abrange inúmeras linguagens: dança, artes plásticas, poesia, música, e cada manifestação requer uma demanda diferente, tem sua peculiaridade e suas necessidades particulares. Quando se pensa em política pública cultural ou se coloca em prática alguma ação voltada para tal, faz-se de forma genérica. Constroem um teatro, por exemplo, pensando que esse espaço poderá abrigar apresentações de dança, teatro, música, mas não pensam que para dança, será necessário um piso adaptado e que para música terá que ser trabalhada toda a acústica do lugar. Instalam aparelhos culturais na periferia sem levar em conta a especificidade do local, o que de fato aquela comunidade produz.

Pouco adianta um teatro, se a comunidade local tem como prática a confecção de fuxico, ou construir uma quadra poliesportiva se a região tem mais de 20 grupos de teatro. A periferia tem uma diversidade social fantástica, além de uma cultura própria bem peculiar. Cada periferia é portadora de um código social distinto: roupa, música, gestos, linguagens, o que a torna mais incrível do que já é, mas ao mesmo tempo, cria mais um complicador: como fazer políticas públicas culturais (que já são generalistas) para esse público tão específico?

A periferia não se enxerga nas políticas atuais, ela não se encaixa, pois além de ser múltipla como qualquer cultura, é bem específica e necessita de outro tipo de proposta. As ações que temos hoje implantadas nas periferias visam tirar ou afastar os jovens, adolescentes e crianças da marginalidade, resgatar esses indivíduos para que eles um dia possam se tornar cidadãos e não mais estar naquela comunidade, não mais estar à margem do “centro” e sim, um dia quem sabe, ser o centro! E será que é isso mesmo que eles querem e precisam? Eles querem e precisam virar centro? E esse cidadão virando “centro”, qual benefício ele trará para a sua comunidade de origem? Ele não foi preparado para modificar o ambiente em que foi criado, mas sim para se afastar dele, e de certa forma, das suas origens. Não se criam condições para que esse indivíduo de fato se torne um cidadão crítico e com ferramentas para transformar seu espaço.

Um primeiro passo importante seria romper com esse “confinamento”, com essa delimitação de periferia e centro. A linha que divide periferia de centro deve ser atenuada, é importante fazer com que a periferia visite o centro, se alimente do que há no centro, mas que não perca sua essência de periferia, sua peculiaridade, assim como dar oportunidade ao centro de conhecer a periferia. Esse intercâmbio é produtivo e pode ser um dos caminhos que nos leve ao fomento de políticas públicas culturais mais eficazes.

Fontes consultadas