Texto escrito por Pedro Diego Rocha

Estreia na próxima terça-feira, 29 de fevereiro, exclusivamente na plataforma online TV Hare, a web novela “Uma Nova Atração”, com 20 capítulos, disponibilizados de segunda a sexta, com duração de até três minutos cada. O projeto, feito de forma independente e sem patrocínio, foi criado pela produtora cultural e diretora Denise Kosta e sua irmã, a atriz Hare Cristina. Com o trabalho esforçado de muita gente, inclusive de muitos quebradeiros e quebradeiras, a história vai ao ar com críticas ao consumismo, à boa e má propaganda, à manipulação das massas e à ética cultural, tudo ao estilo de comédia e alto astral.

“Uma Nova Atração” tem como principal cenário um programa homônimo de auditório de calouros, daqueles antigos. Talentosos participantes (como poetas, palhaços, dançarinos, tudo para privilegiar a arte), troféus, jurados (de papel) fazem parte do espetáculo, logo abraçado pelo público, o que faz a audiência crescer. O enredo fala de um diretor manipulador do povo por meio da TV e o sucesso do programa chama a atenção da Rede Copiamos, emissora de TV concorrente. Eles resolvem espionar e reproduzir, de modo bem evidente os detalhes da atração.

Tem romance, vilões, humor, confusão e toda aquela atmosfera de TV, mas estando na Internet, para ser visto a hora que quiser. O elenco é formado por artistas de diversas fontes, amigos da produção da TV Hare que nem são do meio artístico e viraram atores, uma atriz que pediu para participar pela internet, um participante de São Paulo (presente no projeto em um vídeo). Segundo Denise, os personagens do roteiro, mesmo os com pequenas participações, costumam ser bem expressivos – ou têm uma personalidade marcante, com um bordão.

“Acredito que eles existem de verdade e, a essa hora, desfilem por aí. Dom Cortês se deixa levar pelas propagandas: está feliz, porque pagou quatro e levou três. Katia Cilene é dançarina só em sonho, mas quer se tornar real. Janetinha é a moça das plaquinhas”, conta a criadora sobre suas criaturas. Hare Cristina interpreta Ella Wills, a nova apresentadora do show de calouros e Noelia Albuquerque é sua arquiinimiga, Donna. Também há personagens como a Moça do Sabão, o patrocinador, Neno, Solange e muitos outros. Até uma trilha-sonora para a abertura, cantada por Dani Ribeiro integra o “Uma Nova Atração”.

A secretária do PACC-UFRJ e da UQ, Rosângela Gomes, dá vida à Maraluce, noiva do personagem Peter Tony há 12 anos e que ainda sonha em se tornar sua esposa, cuidando do amado com carinho e o reforço de um rolo de macarrão. Animada, Rosângela comenta sobre sua participação. “Falar do projeto “Uma Nova Atração” é muito gratificante! Porque essa é a segunda vez que tenho a oportunidade de participar de mais um coletivo de artes formado por quebradeiros artistas, produtores culturais e por uma equipe de valor que impulsionam as programações da TV Hare”.

Todo mundo ajuda, até os personagens

Para tornar a experiência ainda mais interessante, foram criados perfis no Facebook, pelos quais os personagens interagem de forma quase real com a página oficial da web novela, o que auxilia na divulgação. Um exercício eficiente de transmídia, com diversos meios de comunicação contando a mesma história. “Uma Nova Atração” foi realizada inteira sem verba externa, com produção simples e gravações por celulares. Atores, produtores e quem mais estava envolvido trabalharam sem cachê algum e muitos ajudaram com doações para fazer o projeto funcionar, com gravações realizadas em apenas três dias.

Atuante na área cultural desde 2001, quando registrou seu primeiro roteiro, Denise e a irmã Hare são a base da TV virtual e contam com a parceria efetiva do ator e publicitário Alexandre Belluno, desde o começo das atividades. “ Mas, quando produzimos um curta, um programa ou uma “novela”, como estamos fazendo agora” é o coletivo que nos move. Todo mundo se doa um pouco, bate prego no cenário, carrega a luz (se tiver), atua e bate palmas”.

“Estamos abrindo um nicho na web”

Cada um dos 20 capítulos diários de “Uma Nova Atração” leva cerca de 48 horas, no mínimo, para ser editado por Denise Kosta. A estas pílulas diárias de informação dramatúrgica, as criadoras da TV Hare dão o nome de “webcapts”. O formato, criado entre 2010 e 2011, mesmo ano de surgimento da emissora virtual, tem marca registrada e caracteriza um novo tipo de novela, adaptado ao ambiente online. Aproveitando todas as possibilidades do meio digital, os webcapts têm dinamismo e interatividade, entretenimento e bom humor.

Para Denise, eles são uma forma ótima de apresentação, com grande aceitação do público e uma boa saída em tempos de complicação financeira. “Nem estávamos pensando em fazer nada atualmente, sem verba é muito complicado fazer uma novela. Estamos abrindo um nicho na web, principalmente aos atores que têm vontade de atuar, mas não têm veículo para aparecer. As mídias tradicionais estão saturadas ou já têm um elenco pronto. A ideia de postar um capítulo por dia surgiu para as pessoas sempre terem um motivo de acessar a TV Hare sempre”, ela explica. A emissora virtual já alcançou três milhões de visualizações em cinco anos de existências, de acordo com a diretora.

Como em todo trabalho cultural independente, é preciso ter jogo de cintura. Denise fala das dificuldades e das soluções encontradas para colocar o planejamento em prática. “Não pudemos ter ensaios, nem regravações, porque as pessoas não dispunham de passagem ou tempo, porque trabalham. Sem dinheiro para equipamento, resolvemos com boa vontade e criatividade e muito material reciclado. De um jeito ou de outro, tivemos tudo o que projetamos. Se não foi o ideal? Pelo menos realizamos. A parte mais complicada é não ter como bancar um mínimo para a equipe, muitas vezes sem verba para passagem até. Todos sabem que é um projeto coletivo e voluntário, o que se ganha é a divulgação”.

Loucas, realizadas e orgulhosas do trabalho feito  

Apesar de Denise e a irmã serem chamadas de “loucas” por muitas pessoas justamente pelo fato de não cobrarem pelas participações dos atores, ela defende que o artista é merecedor de um palco, sem ter que pagar por ele. “Um patrocínio nos traria maior qualidade, recursos técnicos e um mínimo para apoiar o elenco”. Para a diretora, é bom ter a capacidade de produzir, fazer, libertar as amarras dos meios e, sobretudo, contar histórias, mesmo sem o aparato técnico necessário.

“O principal está feito, é um trampolim para até refazer com maiores recursos. Mas, é claro que gostaríamos de produzir com qualidade, com um bom áudio, luz e em HD. Tenho consciência do que faço, sei que às vezes tecnicamente deixa a desejar, mesmo assim, faço, tá feito. É triste ver que tenho que aproveitar uma cena sem foco porque não havia luz ou não deu para regravar”, explica Denise, ciente da força de vontade que a produção tem.

Ao ser perguntada em relação a ter um canal de TV para promover seus próprios projetos, Denise demonstra alívio, emoção, alegria e muito respeito ao trabalho das pessoas. “Uma liberdade! Quem não sonha em ver suas ideias produzidas? O poder de decidir o que vai ou não ser dito. É um “sacrifício” cujo resultado (re) compensa. Além disso, abrir espaço para centenas de artistas e levar entretenimento a milhares de webspectadores é fenomenal, no sentido mais amplo da palavra”.

Bastante lúcida no que se refere ao sua atuação profissional, ela resume seus sentimentos. “Não somos ruins, só não temos as condições necessárias, apesar de conhecê-las. Aos que reclamam, digo, achando graça: ajudem-nos a fazer melhor. Se fôssemos esperar condições ideais, nada teríamos nem ontem nem hoje. Mas, quem sabe amanhã fica ainda melhor? Acreditemos”!

Veja aqui a ficha técnica com o nome de todos que participaram e ajudaram o projeto.