Texto escrito por Pedro Diego Rocha
Nada melhor do que ser bem recebido ao chegar a um lugar, não é? Ainda mais se for a uma faculdade. Pois foi este o clima durante a chegança da edição 2016 da Universidade das Quebradas, que aconteceu nesta terça-feira, 5 de abril e marcou o início das atividades do projeto. Em uma confraternização de boas-vindas cheia de criatividade e arte, os quebradeiros puderam se sentir abraçados, com a calorosa acolhida que foi preparada para eles.
Para abrir os trabalhos, uma breve apresentação da equipe, momento em que a coordenadora geral da UQ, Heloisa Buarque de Hollanda, resumiu o que é a chegança e de que forma o curso funciona. “Este é um momento muito importante para nós e estamos tentando mudar a universidade com isso. E a ideia aqui, a palavra de ordem, é parceria. Tudo que a gente vai ser junto, pensando junto, gerindo junto. Enfim, é uma família. E uma vez quebradeiro, sempre quebradeiro. Vocês podem voltar quando quiserem”, comentou a professora.
Logo após, foi hora de “Numas Quebradas”, canção cuja letra foi escrita pela também coordenadora geral da UQ, Numa Ciro, com melodia da cantora Gabi Buarque, produzida especialmente para a chegança e apresentada por esta dupla. Com uma mensagem (veja a letra no final desta matéria) que abrange toda a pluralidade não só da Universidade das Quebradas, mas da vida em si, a obra foi calorosamente aplaudida pelo público.
Para quebrar o gelo, os palhaços Animanick e Mijolino, interpretados, respectivamente pelos quebradeiros Anick Lorena e Gzus Lima Mijolas, deram uma animada nos presentes, e, como um rito de passagem, realizaram um exercício de relaxamento, com a proposta de mandar embora qualquer energia negativa. Algo bom para um período de atividades no curso de extensão que se inicia. “A chegança 2016 tem o objetivo de congregar e fazer com que os quebradeiros novos sintam o que é a UQ”, afirmou Gzus Lima. Anick andava pelo evento com cartazes oferecendo abraços a todos, um carinho que faz tão bem e quase não se tem hoje em dia.
Quebrando tudo desde já
Os alunos novos não perderam tempo e já chegaram ajudando na arrumação do evento. O rapper Leandro Araújo contou que assim teve a oportunidade de conhecer, se entrosar e saber com quem que vai conviver na UQ. Enquanto arrumava o varal de poesias (escritas por quebradeiros), o produtor Anderson da Vila comentou sobre sua expectativa de chegar e ver todo mundo se ambientando. “Isso é muito bom. Espero aprender muita coisa. Estou muito entusiasmado e espero aprender e contribuir também”, disse ele.
RP MC e Z.K, integrantes do grupo RezaPeka, integraram o elenco de artistas que expressaram seus talentos. Para Raphael Duarte (o RP), participar da chegança mostra como é importante para eles poderem divulgar a cultura dentro dos centro educacionais que existem. “E a faculdade de Letras abrindo as portas para o rap nacional entrar e fazer esta intervenção, mostra que além das barreiras que a gente sofre, de ser discriminado por morar na favela, existem pessoas de outros níveis sociais que estão acompanhando o trabalho, que realmente a veem como um lugar rico de cultura e diversidade”.
Uma grande roda foi feita e cada um dos quebradeiros presentes falou um pouco de si, para que todos se conhecessem desde o início, criando vínculos. Um sorteio de livros também aconteceu, presenteando alguns e, desta forma, aumentando a rede literária. Ao longo do evento, quebradeiros e novos quebradeiros foram apresentando seus trabalhos. Uns contando histórias e poesias, como Leda Lessa, alguns cantando, como Renata Lima e Dani Ribeiro, entre muitos outros.
Jaqueline Gomes, que também mostrou sua voz, falou de um elemento que chamou a atenção na chegança: o Pé de Quê?, uma árvore de livros concebida por Gzus Lima, decorada por ela e construída por Marcelo Ostachevski e Rômulo Ferreira. “O pessoal gostou tanto que acho que a árvore vai ficar. A ideia é a doação de livros. Quem tiver um livro que já tenha lido, é só trazer. E se a pessoa se interessou por algum que tenha na árvore, é só fazer a troca. A questão é quem não tem, pega e quem tem, doa”, explicou Jaqueline.
“É quando chegam os novos. E chegam num lugar onde que eu sei que é hostil”
A produção e realização do evento foram dela, de Aline Oliveira, Gzus Lima, Jessé, Marcelo Ostachevski, Rosângela Gomes, Jurema Cipriano, Anick Lorena, Rômulo Ferreira, Monica Artiles e muitos outros. O buffet ficou por conta da Delícias Já, empresa da quebradeira Débora Vieira, criada para sustentar o projeto Bandeirantes Já, que atende a 250 crianças e ajuda a UQ de forma especial. Com um grande sorriso de dever cumprido, ela achou maravilhosa a oportunidade de participar da chegança.
“Quando eu fiz as quebradas, em 2011, sempre havia um lanchinho. E quando eu soube que ele ia deixar de existir, por falta de verba, entrei em contato com as coordenadoras e falei que ia conseguir um patrocinador. Hoje o Delícias Já e o Grupo Virtuoso fazem esta doação para os quebradeiros em todas as aulas. Para mim, é muito amor que eu demonstro pelas pessoas e sei o quanto é importante este lanchinho para quem vem de longe, que não almoçou”, relatou Débora.
Sobre a chegança e seu valor psicológico, social e humanitário, Heloisa Buarque de Hollanda finaliza dizendo que é o momento mais importante. “É quando chegam os novos. E chegam num lugar onde que eu sei que é hostil. A universidade é hostil a quem não está matriculado, quem não é professor, quem não é elite. A chegança procura inverter, apagar este dado feio da universidade, que é a falta de acolhimento. A gente pensou na chegança para isso: dar uma entrada diferenciada se fosse só a aula inaugural”.
Numas Quebradas
Música: Gabi Buarque
Letra:Numa Ciro
Numas Quebradas encontrei você
Era sol
Era mar
Maculelê
Numas Quebradas você me viu nu
Era só
Era rei
Maracatu
Que maravilha esta vida amorosa
Brincante encantada nas dobras do ser
Quem faz da vida essa coisa engraçada
Sambando nos cacos sabe o que é viver
Lá nas Quebradas o funk ensinou
Vai no passo
Cima abaixo
Brincar de amor
Lá nas Quebradas o Rap mandou
Era a Cor
Era o amor
Rimando a Dor
Foi nas Quebradas que o sonho acabou
Lá nas Quebradas Zumbi acordou
Contou o sonho que teve acordado
E ninguém foi o mesmo
Depois que escutou
Lá nas Quebradas você me despiu
De cima a baixo o meu corpo era um rio
Não tinha mar que tivesse o tamanho
Do amor que o seu corpo o meu corpo invadiu
Numas quebradas você se mandou
Era sonho
Onde estou?
Com esta flor
Lá nas Quebradas eu penso em você
Vem me ver
Vem me ouvir
Pra que sofrer
Vem me ver
Quem és tu
Pra me perder
Vem me ter
Quem sou eu
Pra te esquecer