1. Chegança – Vilma Guimarães, Ler o mundo e a palavra – 7/8 – O que é ler?
2. Charles Siqueira – Ing – 7/8
3. Filosofia 1 – Paulo Cavalcanti – 14/8 – O que é investigar? A função do diálogo.
4. Saída Cultural – Núcleo do Dirceu – 17/8
5. Filosofia 2 – Charles Feitosa – 21/8 – A arte é perigosa?
6. África 1 – Elisa Larkin – 28/8 – O que é ser escravo? O sortilégio da cor.
7. Antiguidade Arte e Arquitetura – Beá Meira – 4/9 – Processos civilizatórios.
8. Odisseia e Ilíada – Tatiana Ribeiro – 11/9 – Qual a relação da tradição oral/escrita?
9. Cultura Hip- Hop – MC Marechal – 18/9 – Arte e mercado.
10. Saída Cultural – O Bicho Suspenso na Paisagem, Ernesto Neto – 21/9
11. Território das Quebradas 1 – Literatura – 25/9
12. Mitologia Yorubá – Renato Noguera – 2/10 – O que é mitologia?
13. Neoclassicismo e Romantismo na arte – Beá Meira – 9/10
14. Literatura Divergente – Nelson Maca/ Eddi MC – 16/10
15. Saída Cultural: Orquestra Petrobrás Sinfônica – 19/10
16. Literatura e a Fome – Ana Kiffer – 23/10 – Fome de quê?
17. Território das Quebradas 2 – 30/10
18. Modernismo – Fred Coelho – 6/11
19. Poesia Brasileira Modernista/ Eucanãa Ferraz – 13/11 – O que é poesia?
20. Modernismo / Beá Meira – 27/11
21. Literatura de Cordel/ Aderaldo Luciano – 4/12 – Faltei
22. Território das Quebradas 3 – Teatro – 11/12
23. B Negão no encerramento – 18/12
24. UQ de Verão – 15/1
25. Projeto / Pablo Ramoz – 22/1- Faltei
26. UQ de Verão – 29/1
27. Centro e Periferia na Dança/ Silvia Soter – 5/3
28. Chegança na Rocinha/ Bráulio Tavares – 7/3
29. Tragédia Grega / Beá Rezende – 12/3
30. Poesia com Chacal – Rocinha – 14/3
31. Texto e encenação – Antonio Guedes – 19/3
32. Filosofia com Luisa Buarque, na Rocinha – 21/3
33. Shakespeare – Fernanda Medeiros – 26/3
34. Música no Oriente – Alba Lírio – 2/4
35. Literatura de Cordel na Rocinha com Aderaldo Luciano – 4/4
36. Afinal de quem é o samba? – Luiz Felipe de Lima – 9/4
37. De onde vem a poesia? – Salgado Maranhão, Rocinha – 11/4
38. Território das Quebradas 4 / Musica e Dança – 16/4
39. Cultura Negra, Elisa Larkin na Rocinha – 18/4
40. Aula Show, André Gardel na Rocinha – 25/4
41. Performance, arte política do corpo – Eleonora Fabião – 30/4
42. Shakespeare e o popular – Paul Heritage, Rocinha – 2/5
43. Poesia e arte – Mana Bernardes – 7/5
44. Carnaval carioca, Fred Goés na Rocinha – 9/5 – Faltei
45. Gonçalo Tavares com Madalena Vaz Pinto, Rocinha – 16/5
46. Fernando Sallis, Cinema hoje – 21/5
47. Subaliro, Rocinha – 23/5
48. Poesia Performática Pernambucana – 28/5
49. Música Erudita – Monique Andries – 4/6
50. O artista está presente – Felipe Moraes, Rocinha – 6/6
51. História da TV – Guilherme Vasconcelos – 11/6
52. Linha de cor com Nelson Vieira, Rocinha – 13/6
53.Território das Quebradas 5/ Rocinha no Flamengo – 18/6
54. Saída Cultural – A Peleja da voz com a língua , Numa Ciro – 20/6
Minha lembrança é nebulosa em relação aos exatos acontecimentos que me levaram às Quebradas em 2012. A inscrição, a entrevista. Foi tudo muito rápido, muito simples. Imediato. Fluiu. Quando dei por mim, já estava dentro.
Não me lembro de ter feito uma escolha deliberada, de ter me dado tempo de pensar no assunto. Vim pras Quebradas de olho fechado, atendendo não apenas a um simples chamado interno, mas a um impulso inexplicável, porém eficientíssimo, que me moveu sem ambivalências, me fez esperar um semestre e me colocou em sala de aula com alegria e entusiasmo juvenil, um sentimento raro de ter encontrado a minha turma, patinho feio que sou.
Que turma?
Está certo. Já sabia da potência da antena da Heloisa, que conheço de outros carnavais, para não dizer encarnações, desculpe a liberdade. Já tínhamos nos cruzado na PV. Tínhamos parentes e vizinhos em comum. Já era a Heloisa fazendo parte da minha mandala pessoal via Mana e outras vias.
Está certo. Sou frustrada em relação a títulos acadêmicos que não conquistei. Fui presa, torturada, exilada desde muito cedo. Antes mesmo de elaborar um discurso político, fui penalizada. Fui impedida de estudar. Não tenho nem carteira de motorista, e até que me provem o contrário, acuso a história por isso. Outras leituras posso fazer agora dessa marginalização imposta. Só recentemente pude vir a considerar esta postura como opção. Na época, parecia falta de escolha. A vida não me deu expectativas fora da clandestinidade. Não aprendi a fazer projetos; até o meu desejo era nebuloso e não assumido. Levantei a bandeira do aqui e agora com toda a veemência que os tempos exigiram; este era o meu combate, a minha resposta. Por um tempo não quis nada com a hora do Brasil. Nenhum status me seduziu. Meu refúgio era a minha intimidade doméstica, meus filhos pequenos, minha horta, minha yoga, meu altar de meditação.
Está certo. Aprendi outras coisas. Ponho o pé na estrada como ninguém, sou easy rider de primeira, modéstia à parte; boa de acampamento, ponho uma mochila nas costas, durmo em sleeping bag e sonho descaradamente até hoje. Não posso negar, o exílio foi um privilégio. Me tornei nômade, flexível, excêntrica, de facílimo trânsito e alta curiosidade. Tenho mediunidade, sei tocar, sou boa massagista, parteira, poeta, artesã. E o mais importante: três partos normais, sem anestesia.
Está certo que faltava um meio de legitimar esses saberes, às vezes um nome, um fundamento, um pouco mais de organização das ideias, de definição, de teoria que fosse. Um território que fizesse a trama visível, palpável.
A arquitetura da UQ, o pé direito, o estilo tradicional, o espaço renovado e limpo, as instalações, a câmera, a tela, o praticável, os microfones dão solenidade às aulas. Esta foi minha primeira impressão, acrescentada de uma sensação de esteio em cena ali naquele conforto sólido, tradicional.
Um ritual em que o conhecimento é reverenciado como valor maior. Não uma sala de aula qualquer. Uma sala especial, arejadíssima, com cheiro de história, antiga porém renovada, inovada. Sensacional! Fui seduzida por este lugar, um templo de difícil definição.
A segunda constatação, não menos importante, foi a de inclusão, acolhimento. Percebi de cara, com espanto, um afeto circulando no espaço, abraçando todo mundo. Adivinhei que não seríamos proibidos de viver e entendi que passaríamos pela aprendizagem significativa. Ou seja, que os conteúdos poderiam ser importantes, e sem dúvida seriam, mas a forma era genial.
E aí comecei a conhecer pessoas novas, interessantíssimas. Todos com fair play pedagógico. Incentivadoras do debate. Encontrei não só permissão para me exprimir. Mais do que isso. Entendi que a minha expressão seria solicitada como parte integrante do processo. Sorri.
Como assim um lugar onde todos se expressam? Onde o que cada um tem pra dizer conta, conta realmente? Onde a expressão é incentivada? Onde não falta espaço para falar? Um espaço por assim dizer terapêutico dentro de uma sala de aula com ares de convenção? Não acreditei! Achei engraçado, no melhor sentido da palavra, me deu um alívio de séculos!
Não vi ninguém defendendo verdades, não vi cobrança. Vi um jardim muito belo. Um lugar de encontro. A máxima africana que aprendi com o Sotigui Kouyaté, talvez a pessoa mais sábia e carismática que tive a honra de cruzar na vida, de que não existe nada além do encontro, voltou a minha cabeça milhares de vezes nestes meses.
Que encontro!
Quando dei por mim, já estava pertencida/pertecente, e não podia imaginar uma semana sem isso. Passou a ser vital. Uma construção foi se processando não só durante as aulas, mas nas entrelinhas.
Muito deveria falar das entrelinhas.
Primeiro senti falta de um fio condutor, mas com o tempo, na medida da minha inserção no grupo, parei de sentir esta falta. Um novo personagem foi surgindo aos poucos, organicamente, em mim, ainda embrionário está certo, mas com mais e mais vontade de participação. Saí da toca! Achei incrível não ter para isso que vestir uma máscara nem ter a preocupação em ser aprovada ou desaprovada. Quando a Beá me convidou para ir a Rocinha, achei natural, era isso mesmo. Não existia um esforço, era uma evolução natural. Solicitei ajuda no custo do transporte, mas como não houve resposta, dei o meu jeito, por considerar de primeira importância honrar esta oportunidade privilegiada de deslocamento, já que deslocamento é o meu forte. Os assuntos das aulas foram aparecendo e um a um os identifiquei, todos, sem exceção, como pertinentes à minha construção de cidadã, finalmente agora coberta por uma instituição federal pública de ensino. Antes tarde do que nunca. Vitória. Eram assuntos familiares que agora seriam vistos, examinados com outra luz, redimensionados. Fui adentrando neste universo institucional sem firulas, sem frescura e sem o sofrimento que imaginava ter que ter. Não precisei negociar, pois estou ocupando o lugar do fruto que cai de maduro. O lugar próprio. Caí de madura no chão das Quebradas.
Percebo da mesma altura de importância a relação com a coordenação, com as pedagogas, professores, bolsistas, técnicos e com os colegas. Às vezes nem consigo perceber direito quem é quem. Quando dei por mim, estava apaixonada. Apaixonada pelo coletivo. Sinto alegria permeando o ar e vejo por mim, como sou capaz de superar inúmeras dificuldades pessoais para dar prioridade a este encontro, pois estou totalmente convencida da importância da presença assídua para a libertação de uma voz falante e potente que ecoe para além dos traumas. Sou muito interessada na construção do conhecimento coletivo, no aprendizado significativo. Os conteúdos só têm valor se me jogam na vida. E nas Quebradas é isso. Sinto que dei, graças ao respeito dado a minha história, o primeiro passo para manter sempre ativa minha pulsão para o saber.
Sou alimentada também pelo lanche. Trago na bolsa sempre uma maçã para o altar da minha casa, onde deposito a minha fé e tiro forças para prosseguir. A UQ está ordenhando meu desejo de potência, de troca, de voz. Seria esta ordenha a mais alta performance pedagógica?
Questões como a leitura, a filosofia, a arte, a poesia, a literatura, a escravidão, processos civilizatórios, oralidade, escrita, performance, teatro, academia, saber popular, saber erudito, música, marginais, negros, índios, África, mercado, política são algumas das infinitas perguntas, sementes sobre as quais o trato cultural se debruça.
E é isso que não posso e não quero perder: disposição para o cultivo. Não é disso que se faz cultura?