A UQ Rocinha discutiu, na última quinta-feira, a origem e a história do carnaval carioca. O convidado para falar sobre o assunto foi o especialista Fred Góes, professor de Teoria Literária do Departamento de Ciência da Literatura da Faculdade de Letras da UFRJ, pesquisador de MPB e autor de diversos livros sobre o carnaval do Rio.
Para começar, Fred voltou às origens do samba. Numa aula de história, o professor contextualizou o surgimento do Entrudo, costume trazido pelos portugueses que consistia em fazer brincadeiras durante o Carnaval. A fabricação de limões de cheiro (balõezinhos com líquido perfumado) para arremessar em outras pessoas durante os dias de folia, por exemplo, criaram a tradição de se “brincar o carnaval”.
Apesar de comumente praticado pelos escravos nas ruas, o entrudo ganhou versões familiares, para que pudesse entrar nas casas da elite. Durante a semana mais esperada de fevereiro, as famílias nobres davam festas, nas quais os limões de cheiro eram artigos de diversão e possível contato entre mulheres jovens e possíveis pretendentes.
No entanto, o entrudo foi condenado ao esquecimento pela Reforma Pereira Passos, realizada no centro do Rio no início do século XX. Seguindo uma política higienista baseada no racismo e na exclusão social, o então prefeito da cidade comandou um “bota a baixo” dos cortiços que dominavam os bairros centrais da capital fluminense e jogou a população pobre – e muitos aspectos de sua cultura – para a periferia das encostas dos morros.
A partir dos anos 20 e 30, o carnaval festivo que conhecemos até hoje começou a ser popularizado pelo veículo de comunicação mais eficiente da época: o rádio. A divulgação das marchinhas antes de fevereiro causava alvoroço durante a espera pelo Carnaval e garantia que os foliões pudessem acompanhar o ritmo que embalava os bailes.
Já os tradicionais desfiles da Sapucaí e suas fantasias deslumbrantes, tem uma origem mais antiga. Em 1885, após a incorporação do entrudo aos hábitos da elite, começaram a ser tomadas algumas atitudes para transformar as festas carnavalescas em festas civilizadas. A classe rica passou a tentar dominar o carnaval de rua, criando desfiles de carros abertos com quadros do rei e da rainha do Brasil pelas vias públicas. Transportando a segregação social já presente na sociedade para o carnaval, a elite tentou se colocar como a categoria digna de ser admirada numa carreata, enquanto os pobres colocavam suas fantasias para ficar apenas assistindo à distância.
Ainda que não tenha se mantido como tradição, o desfile elitista tem hoje outra conotação. No sambódromo, grupos restritos desfilam enquanto multidões assistem a tudo sem participar. Herança ainda mais triste das carreatas em homenagem à família real é a comercialização da maior festa popular carioca. Enquanto no século XIX a elite queria se apropriar da tradição, hoje são comerciantes, empresários e outras patrocinadores do “maior show da terra” que transformam uma tradição cultural num espetáculo comercial.
Como melhor lembrança do entrudo fica até hoje o espírito brincalhão dos foliões e a liberdade durante os quatro dias de festa. Na cidade do Rio, o verdadeiro Carnaval acontece nas ruas, do centro à periferia, sem camarote, ingresso ou portão.
Por Júlia de Marins – Bolsista PIBEX/ECO – 13 de maio de 2013