Na última terça fomos levados à uma reflexão sobre o amor, dentre outras coisas, através da filosofia africana (mais especificamente da etnia Dagara), pelo professor Adjunto de Filosofia do Departamento de Educação e Sociedade (DES), do Programa de Pós-Graduação em Filosofia da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), Pesquisador do Laboratório de Estudos Afro-Brasileiros e Indígenas (Leafro) e do Laboratório Práxis Filosófica de Análise e Produção de Recursos Didáticos e Paradidáticos para o Ensino de Filosofia (Práxis Filosófica) da UFRRJ; Renato Noguera.
Baseado no trabalho de Sobonfú Somé, pensadora e psicóloga burkinense da etnia dagara, no livro “o espírito da intimidade” Renato apresentou uma critica a perspectiva ocidental. A filosofia dagara se entende por reflexões e inflexões baseadas na cosmovisão da áfrica ocidental do universo Niger-Congo, um sistema crítico de pensamento que problematiza e desastibilza perspectivas sobre a realidade.
Essa filosofia vê o espírito como energia vital. O amor é vivido de uma maneira espiritual, dentro da comunidade não existe diferenças entre a palavra sexo e amor. Na escolha de um par, se faz necessária uma consulta com os anciões para verificar se as energias são compatíveis. A escolha é feita a partir de um jogo, o cauri, e de uma cartografia espiritual.
O relacionamento afetivo não deve baseado em paixão ou aparência física, a pessoa se casa para o bem da comunidade. Existe uma dimensão espiritual em todos os relacionamentos, independentemente, de sua origem. Duas pessoas unem-se porque o espírito as quer juntas. A vida amorosa, uma experiência radical de intimidade, colabora para o desenvolvimento espiritual, ajuda a manter a sanidade e traz benefícios à comunidade.
A figura dos guardiões é de suma importância para a comunidade dagara, eles são percebidos como pessoas dotadas de um poder de fazer conexões com o espírito. Os gays e lésbicas da etnia são escolhidos como guardiões, pois possuem a capacidade de canalizar sua energia sexual para o espírito e se baseiam pelos próprios fundamentos. Entre os fundamentos básicos da comunidade estão; o espírito, crianças, anciões, responsabilidade, generosidade, confiança, ancestrais e rituais.
Para eles, pessoas envolvidas em um relacionamento puramente sexual, por exemplo, carregam dentro de si um gigantesco buraco energético, que as isola completamente do seu eu. A pequena sociedade Nagara é agrária e aldeada. Ali existe ritual para tudo. Por exemplo, uma vez por ano os homens se vestem de mulheres e choram e as mulheres se vestem de homens e caçam.
Nagara é uma sociedade matrilinear, matrifocal e patrilocal, mora se com a família do pai, mas o legado vem da mãe.
Perguntado sobre quem seriam os malfeitores nesta sociedade, Renato usou a narrativa do filme Kiriku para explicar que o mau, personificado pela feiticeira Karabá, é o resultado de um sofrimento. Karabá só se alivia de sua dor praticando o mal. É preciso cuidar destas pessoas, tirar seus espinhos, para que elas possam fazer o melhor pela comunidade.
Referências complementares:
SOME, Sobonfu; O Espírito da intimidade, Ensinamentos ancestrais africanos sobre maneiras de se relacionar, São Paulo, Ed. Odysseus, 2007.
Kiriku e a Feiticeira; animação franco-belga, dirigido por Michel Ocelot, 74 minutos, 1998.
Octávio Neto, Bolsista PIBEX PACC\UFRJ