Universidade das Quebradas com Lilian Thuram, por Rogérias Reis
Francês, ex-jogador de futebol, começou o seu discurso com a seguinte questão:
Por que a cor negra tem uma conotação tão negativa?
Para uma resposta recorreu à história.
Uma construção ideológica, intelectual se faz ao longo do tempo e foi exatamente assim com a questão do racismo.
Lilian frisou a importância de se lembrar que a escravidão surgiu de um processo de dominação econômica que buscou suas justificativas na construção ideológica da inferioridade baseada na cor da pele.
Lembrou que o sexismo é bem mais antigo que o racismo.
Falou dessa cultura interiorizada no ser, que hierarquiza pelo sexo, cor da pele, religião, etc.
A forma de pensar o mundo é transmitida de geração a geração e muitos hábitos, comportamentos são condicionados, daí a importância da educação na reversão de processos negativos como esses.
Sua fundação trabalha nesse sentido e tem como público alvo a infância e juventude.
– Não podemos reproduzir esses hábitos. Afirmou.
Acredita que a vitimização não contribui para o processo da desconstrução ideológica do racismo e que não se deve pensar a comunidade negra apenas sob o recorte da escravidão e que em suma o trabalhar é no sentido de reforçar outros pontos importantes da cultura e da história dos negros e as múltiplas possibilidades a serem exploradas dessa comunidade.
Para isso, faz-se necessário conhecer os mecanismos da sociedade na qual o negro está inserido.
Afirma que quando as crianças francesas vinham lhe pedir autógrafos, lhes perguntava o que sabiam sobre a comunidade negra e que as mesmas respondiam algo sempre relacionado à escravidão, o que querendo ou não coloca o negro numa condição de inferioridade no imaginário dessas crianças.
Com relação aos negros interfere na auto-estima o fato de serem reconhecidos, identificados apenas como aquele povo que um dia foi escravizado.
Acredita que ficar buscando os culpados não vai ajudar muito e que pode levar a um ciclo vicioso de opressor e oprimido. A ideia que se projeta sobre o negro o faz sentir-se inútil e incorporar esse discurso.
Essa hierarquização herdada do passado precisa ser suplantada e para isso acredita na educação.
Não fornecer educação é uma forma de controle.
Foi questionado quanto ao papel da mídia que sustenta esse modelo e respondeu que as escolas de comunicação precisam passar por esse processo de educação também.
Foi interrogado pelo poeta Márcio Rufino, se na Europa existem movimentos que visam uma reparação da violência aos países colonizados e Thuram respondeu que não são feitas reflexões nesse sentido na Europa, uma vez que a ideia de dominação e de poder ainda persistem, sendo a relação de força ainda muito presente nos dias atuais.
Questionou a existência de uma plena democracia.
A África é uma diversidade e rica em minerais mas continua sendo explorada e nesse momento falou de um componente presente em todos os celulares, que é matéria prima retirada do Congo e de jazidas na Amazônia.
Pesquisei e verifiquei se tratar do Coltan, composto do nióbio e tântalo, imprescindíveis para a indústria aeroespacial, utilizado em celulares e com poucos reflexos sócio-econômicos para a República do Congo, pois é contrabandeado para sustentação da guerra civil.
Eis o link que trata desse assunto:
http://revistagalileu.globo.com/Revista/Common/0,,ERT220844-17773,00.html
Falou da dificuldade de se estabelecer parcerias com o ministério da educação francês, mas que fornece o material didático da sua fundação aos professores que solicitam e que realiza palestras nas escolas.
Disse que há muitas pessoas com boa vontade na França e que querem mudanças, sobretudo os professores nos quais tem encontrado muito apoio.
Acredita que houve avanços com relação ao racismo mas que a luta deve continuar.
Foi interrogado pelo Tetsuo Takita, se acredita na arte como instrumento de transformação ideológica e respondeu que os artistas devem ter essa consciência de que a arte pode ser usada para transformar, amenizar ou reforçar uma corrente ideológica.
Contou que foi influenciado pelo Franz Fanon, ao ler o seu livro “Pele negra, máscara branca”.
Defende a libertação dessas identidades, acredita na existência de várias culturas e que cada uma dessas acabam nos influenciando de algum modo.
Tive a impressão de que não acredita numa cultura engessada ou dita pura.
Nessa fala seu discurso se afasta metodologicamente do mais enfático, defendido pelo Abdias Nascimento que pensou na reconstrução e na consolidação de uma identidade nacional negra tendo como referência a mãe África.
http://revistathema.ifsul.edu.br/index.php/thema/article/viewFile/104/45
O discurso de Thuram é moderado, equilibrado, diplomático, três adjetivos com a mesma conotação.
Afirma contar com um banco e companhia de seguros como parceiros.
Muito interessante isso…
Foto José Otavio
Rogéria Reis quebradeira da 4a edição da UQ